domingo, janeiro 04, 2009

Data-limite


(staring at the sea (Hopper no Maine) - Alex7 - 2008)

Estou a adiar-me todos os dias.
Dir-se-ia que algo me prende
sem me prender, mas nada me prende
Deve ser por isso que não me solto
e continuo a adiar-me todos os dias.

sexta-feira, setembro 15, 2006

Estio


(rooms by the sea - Edward Hopper - 1951)


Só luz numa parede branca.
Quanta coisa pode encerrar
esse brilho, coisa nenhuma
de que tudo é feito?
Como podem esses raios
trazer-me tanto sentir
e uma suave nostalgia
de tardes passadas
em vão, só sonhando.

A fitar a luz tão branca
nas pedras rudes da calçada
nada assoma à mente –
só um êxtase perpétuo,
perdido no estio de Lisboa.

sexta-feira, maio 19, 2006

Sepulcro



Se toda a vida ficasse assim,
em campa rasa da memória,
seria mais fácil recordá-la
e da terra seca se faria a história.

Todo o sentir – se ficasse gravado
nas poucas palavras dum epitáfio,
não teria de procurar perdido
quando te busco nas lembranças.

Não secariam as reminiscências
como as flores na jarra partida,
suja de terra e recordações;

Nem a dor de já não ser
seria grilheta em sepulcro
prendendo o amor que queria ter…

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Sinapse

De mim para ti
como raio de luz
ou gota de orvalho.
Instante eléctrico
de emoção garrida
em cor de raio.
Difusão biónica
de calor humano
em base plasmática.
Sinapse difusa
em mente confusa
num desnorte magnético…

(não é quando se quer que a faísca refulge, nem sequer quando se pensa que sim... é só quando.)

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Gimme a sound to play!

São capazes de imaginar um mundo sem música? Assim uma espécie de taliban-world mas sem hipótese de reversão? É uma ideia assustadora, muito mais do que qualquer medo de pacotilha em fita de série B para assustar meninos de coro.
Não a ausência de som, mas a impossibilidade visceral de o arrumar em música!
Brrrrrr……… Eu dava em doido, se já não fosse…


Dador Universal

Quem dera fosse pintor, nos idos de oitocentos
e pudesse afogar as mágoas em copos pequenos de absinto…
Em vez disso saiu-me a alma aberta, transparente,
em que todos vêem o que não sai de mim!

Quem dera fosse poeta, álcool rouco na voz
de uma vida desperdiçada em vielas raras de sol.
E talvez um acesso de tosse, assim telúrico,
para compor veramente a imagem do sofredor.

Quem dera fosse pedinte, cantando a solo a angústia
em qualquer esquina da vida, andrajosa e infiel.
E só trazer no peito o tísico peso do desespero,
sempre acompanhado à viola pela solidão anónima.

Quem dera não ser nada, só rara ausência,
enovelar-me confortável no vazio quentinho,
útero em que me dobrasse e não nascesse,
apenas não fosse e não pensasse.

E nesse vazio infinito, só amar tudo
e rir, desalmadamente, de mim e da vida.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

O regresso da Esfinge



Fato Cinzento

Estaremos todos condenados
a só cantar canções de amor
e nada mais?
E ainda amar a natureza,
dar as mãos
não cuspir para o chão nem para o ar
e atravessar, sempre,
nas passadeiras?
Que é do frémito, da emoção?
Do prazer de dizer não
e estar teimosamente
errado?
Por que não arriscar
gastar a vida num segundo?;
porque, num segundo,
cabe o destino do mundo.
E o futuro, que todos
dizem querer apanhar.
Poder ser ser sem devir,
álibi falhado dum crime
que cometi
Senso comum enganado
engalanado de penas
e conféti.
Não sirvo para cinzeiro de mim
nem para soprar as cinzas dos outros.
Não me serve um fato cinzento.
Não sou um fato cinzento!
Deixem-me ter cor, por favor,
e adivinhar o amor
que não senti.

segunda-feira, novembro 01, 2004

Para recordar quem já não anda por aqui...

Recordação

Lembrar alguém é mantê-lo
vivo. Que há de mais perene
que a lembrança, a ideia som
ou perfume que a alguém
se reporta?
Chamar alguém pelo nome
é fazê-lo existir. Por sermos
chamados, existimos. E se
quisermos lembrar alguém,
basta chamá-lo.
Agora ou no Fim, virá!

Postado em colaboração com o blog Krónikas Tugas

sábado, julho 03, 2004

Cal

Para Sophia...

Lutar por mares diferentes
não foi sina – foi das escolhas
a que a liberdade prefere;
Porque antes a espuma branca
sem limites, que o pedestal
dourado que só cerceia.

É por lutar por mares só desses
que o mundo em si se encanta
e se eleva da luz a cor de ti,
mediterraneamente branca…

quarta-feira, junho 02, 2004

Fénix Nula

Vê o mundo nos meus olhos.
E na dimensão infinita desta íris
que é da cor do amor por ti,
avista o horizonte ebúrneo
para lá do crepúsculo em que
me encerro.

Descansa a alma no meu ser.
Deves estar cansada – ou meditas
em coisas outras que não eu,
porque eu não posso ser tudo,
e já me gastei todo para te
tentar ter.

(Rebusco os silêncios embaraçosos
procurando onde a linha se partiu:
só descubro labirintos lodosos
e pobres seres que outrora eram eu.
As dores de alma sinto-as longínquas
como algo que se foi e não fosse meu…
Amores impossíveis, que desbarato
à toa por me ficarem grandes demais,
são apenas um murmúrio que ecoa
na minha mente, entre os meus ais.)

Vem celebrar comigo, fugaz,
esta derrota que não entendo e
vitoriar sem senso a minha desdita.

Sou
Alma tão gémea que se cola a ti
Segunda pele que todos os dias
te afaga.
Mas sendo tudo isso,
sinto que tudo perdi –
Como uma Fénix nula
que só arde e não renasce!

quarta-feira, maio 05, 2004

Diáspora de mim

Cálido ouro cor de pele,
seda e opalas no olhar;
Esfíngico sentido em ser
prazer, em cada gota de estar.

Límpida noite em que mergulho,
sensual fonte que reluz!
Em cada palavra a encosta alva,
no cume o círio que conduz

à mãe dos sentidos, diáspora
do existir – estou espalhado
em mil átomos cindidos

pela voz do Mundo, eco
do Universo Todo, plasmado
em singulares segundos.

sexta-feira, abril 23, 2004

Depois de nós

Depois de nós virá quem nos esqueça
até sermos só avós num álbum velho
faces serenas, poses concretas
intactas imóveis sobre papel amarelo.

Já pensaram alguma vez que poucos anos depois de desaparecerem ninguém se lembrará de vós? Talvez restem algumas memórias passadas entre gerações, umas quantas fotos e vídeos, mas já ninguém vos conhecerá! Tudo aquilo que fomos ter-se-á perdido: os sonhos, os erros, as alegrias - tudo, perdido para sempre... Seremos apenas avós num álbum velho.
Não é a ausência que é a morte que me assusta! É a obliteração total que me arrasa!

quarta-feira, abril 07, 2004

E agora, José?

Quando nos pomos a perscrutar o sentido da vida e não somos monges budistas ou afins, algo vai mal. Ou, pelo menos, não vai bem - sim, que entre o bem e o mal existem muitas hipóteses de lógica incerta que podemos utilizar!
Acontece-nos mais quando não há amor no horizonte, nem dentro de nós. Parece então que a vida se reduziu à rotina e será sempre o repetir das coisas triviais do dia a dia. Só que eu tenho um remédio para isso: basta começar a dar atenção a todas as pequenas coisas que vemos, que nos rodeiam e que na maior parte das vezes nem da sua existência nos apercebemos. É fácil sentir a felicidade por uma fracção de segundo quando nos levantamos e vemos lá fora uma luz de Primavera, um sol que convida a despertar. Ou uma mulher bonita. Ou um crepúsculo digno de deuses - imaginem Lisboa vista da ponte Vasco da Gama, aninhada sob um céu de azul carregado, com parte da luz do dia ainda no seu âmago; um rio como espelho verde escuro afaga-lhe os pés; enquadrem essa imagem em modo panorâmico com os vossos olhos, porque câmaras não captam emoções; sintam o divino dessa imagem, mesmo não professando religião, e tudo faz mais sentido - eu já o vi!
Irra, que lamechice! Mas é verdade. É que às vezes só mesmo sendo lamechas se conseguem expressar certas coisas.
É claro que podemos afogar as crises existenciais em álcool e sexo - também resulta, mas dá ressaca...

terça-feira, março 30, 2004

Palimpsesto

Tento raspar-me como velho manuscrito
apagar da vida o que já foi sentido
e reescrever-me no pergaminho
dos caminhos incertos que trilhei.
Balas perdidas acertaram sempre em mim
e mesmo na ausência fui sempre culpado
porque não soube perder nem amar;
(só a vida passou ao lado –
e não adianta chorar do que não sei.)
Reabri a existência lentamente
tentei no palimpsesto ler sobre o passado,
mas nas palavras novas era evidente
que as mesmas coisas faziam o fado
e surgiam os mesmos erros
por todo o lado…

sábado, março 27, 2004

Adimensional

Às vezes ouço o silêncio a pingar. Nunca encontro a torneira para o fechar bem...

domingo, março 21, 2004

O sal da vida causa hipertensão?

Ai a dúvida, a dúvida... Se tudo fossem só certezas que bom que era! Saber sempre qual o caminho, não hesitar nas decisões, ter a certeza do que sentimos. Que bom que era não haver dúvidas! Saberíamos à partida a que costas aportar, com quem deveríamos sempre falar e o exacto momento em que nos iríamos apaixonar. Cairiam cerces à nascença as atracções dúbias, e nunca cometeríamos qualquer erro. Era bom, não era?
...E daí talvez não! São as dores que nos esculpem, as angústias que nos definem, as dúvidas que nos aperfeiçoam! Sem o sal da vida de que tédio seríamos vítimas? É claro que custa não saber, avançar no escuro, cair no erro ou no logro, sofrer. Mas sem a sábia dúvida alguma vez chegaríamos a ser? Se tudo nos fosse apontado não seríamos como títeres de um argumento já lido? Não sei, não sei... só me restam dúvidas acerca disto.

Contradições
Vinde, fracos de espírito,
regalai-vos com o reino dos céus
e com a idiotia de Deus.
Deixem-me a mim os pecados,
as vãs glórias e as tristezas
e ficai com o vazio de emoções.
Basta-me o riso e o choro,
a beleza e a crueldade
do fim de todas as coisas.
Quem quer viver para sempre,
nas rugas do passado se perder,
e olhar o tempo eternamente?
Já outrora disse sim?
Mas não foi já o solo, sol,
e a fruta madura, chão?
Deixem-me enlouquecer,
sossegadamente,
com a minha feroz contradição...

sábado, março 20, 2004

Multiplicidade!

Vejo-nos limitados ao que somos, sem espaço à multiplicidade, ao ser o outro que sou eu. Cingimo-nos ao fato cinzento da rotina dos dias e não ousamos sair dos olhares que os outros nos dirigem - somos sempre os mesmos e como os outros querem!
Porque não romper correntes, largar amarras, sair em órbita tresmalhada para os observadores do lugar comum? Mas é difícil cortar, porque gostamos de alguém ou alguém gosta de nós, porque precisamos de um emprego, porque é mais cómodo assim e é assim que levamos palmadinhas nas costas e festas de aniversário...
Então vamos ser mais suaves e tornemo-nos apenas camaleões de trazer por casa, travestis da palavra que perpassa da mente - ela pode ser quem quiser, incoerente ou trágica, sarcástica ou poética. Inventemo-nos todos os dias em mil de nós, sejamos perplexos, cómicos, anoréticos; bestas ou querubins, palhaços ou vingadores - podemos ser alma erguida e depois derrubada e nem ficam vestígios, só fica a palavra.
Assim nunca ficaremos sós...

Herético

Estou aqui sem saber nada:
Homem estátua de palavra ausente,
besta parada e incoerente
em não-trânsito para lugar nenhum.

Evoco o que nunca sonhei:
Tento encontrar um sentido,
uma brisa de senso, um porto de abrigo,
mas só encalho no lugar comum.

O que será que faço aqui,
embrulhado na história
das façanhas dos outros?
…………………………………
Já me apercebi não ser eu daqui:
O meu olhar é outro
e outra é a minha crença!


Quando as coisas não fazem sentido, quando nos sentimos fora dos outros, talvez olhando dentro de nós e assumindo o que somos e o que pensamos cheguemos a um qualquer renascimento...
Mas sempre transgredindo, porque é da transgressão, do sacrilégio, da heresia, que nascem os caminhos que nos conduzem pelo futuro.


Alabastro

Quando só se rasteja pela dor
de não ter feito o que era certo,
pode invocar-se o amor
mas só se nos depara o deserto…


Pois é, o tempo não volta atrás e o que foi feito, de mal ou bem, não é remissível pela nossa vontade...

domingo, março 07, 2004

Quem nunca...

Put it on
And don't say a word
Put it on
The one that I prefer
Put it on
And stand before my eyes
Put it on
Please don't question why

Can you believe
Something so simple
Something so trivial
Makes me a happy man
Can't you understand
Say you believe
Just how easy
It is to please me

Because when you learn
You'll know what makes the world turn

Put it on
I can feel so much
Put it on
I don't need to touch
Put it on
Here before my eyes
Put it on
Because you realise
And you believe

Something so worthless
Serves a purpose
It makes me a happy man
Can't you understand
Say you believe
Just how easy
It is to please me

Because when you learn
You'll know what makes the world turn

Blue Dress - Depeche Mode in "Violator"


Quem nunca sentiu isto por uma mulher, ou algo semelhante em algum momento da sua vida, é quase de certeza rabeta (ou tão estúpido e bócó que vai dar no mesmo!).

segunda-feira, março 01, 2004

Clube de Combate

Quero esmagar as trombas à realidade! Afundar-lhe os malares com um murro bem dado! Talvez assim, ferida de morte, me largue e me deixe ser o que quero, quando quero, onde quero...
Mas será que voltando as costas a tudo o que nos parece supérfluo encontraremos o que vale na vida? Ou deparar-nos-emos apenas com o nada, a ausência, porque as nossas pobres e normais vidas mais não comportavam do que coisas sem importância, pechisbeque materialista e paixões bem comportadas, com cama, mesa e roupa lavada, das 9 às 5, com direito a subsídio de férias e 13º mês?
Como podemos ser Tyler Durden's se estas dúvidas nos assaltam? Ninguém quer assumir o risco - o preço pode ser demasiado alto.
Ah, mas que satisfação sentiria se pusesse a realidade KO! Nem que fosse por um mísero minuto...
Já é tarde. É melhor ir dormir porque a realidade amanhã tem de ir trabalhar.

quarta-feira, fevereiro 25, 2004

Um Verão Marciano

Há coisas como segredos. Parecem só nossas.
E de cada vez que as percorremos renovamos o domínio, a posse e afastamos as inevitáveis invasões do que é só nosso.
Ponderamos mostrá-las, mas revolta-nos a traição potencial, o perder dos pequenos tesouros…
Melhor mantê-los ao abrigo da cobiça imaginada dos outros e continuar a usufruí-los como ouro.
Todos temos destas coisas.
Todos possuímos destes segredos imaginados, pequenos universos que nos adoçam a vida.
(Nunca os percam…)
É melhor nunca perdê-los…

(escrito ao som do vinil – Johnny Warman, Walking into Mirrors)

domingo, fevereiro 22, 2004

A carne que não vale

A máscara que se assume é sempre nossa e não sendo o nosso rosto é a nossa alma – somos sempre nós…

quinta-feira, fevereiro 19, 2004

O Espirro de Telémaco

Quis ser profeta um destes dias,
daqueles com tédio e nuvens baixas
que nem o passado deixam entrever.
Menti-me prevendo-me ufano,
de futuro aberto em largo sol,
mas já sabendo que não o ia ser.

Como o espirro de Telémaco
que serviu de augúrio à vidente,
também brilhante não me enganei sequer…

domingo, fevereiro 15, 2004

Desabafo

Quero deitar tudo cá para fora!, gritou ele. Depois vomitou.

Fronteiras

Estamos na fronteira. Entre o génio e a loucura. Entre o ódio e a paixão.
Estamos na fronteira entre ser e parecer, entre o que os outros vêem e o que os outros sentem. De nós.
Aqui posso ser o que quiser. Aqui posso ser o que sentir.
Não me prendem corpos nem morais. Não me restringem regras nem conceitos. Sou todos ou nenhum. Sou eu. Ou tu, tanto faz.
Quem ler que o sinta…
Estamos na fronteira.

sábado, fevereiro 14, 2004

Ainda que possa...

Ainda que possa não quero ser assim.
Ser outro tem outra nobreza, ideal,
e ser eu até aos confins de mim
sabe a comida insípida, sem sal.
Ainda que possa não sou só de mim,
perdi-me algures no encanto do olhar,
e não quero voltar ao cinzento dos dias
em que só eu me sentia respirar.
Ainda que possa não vou tornar
a ter horas sós sem que me encontre,
sem lábios que beije na noite
sem ter alguém em quem pensar...

E eu que nunca comemoro esta treta do dia dos namorados...

sexta-feira, fevereiro 13, 2004

Sexta-Feira, 13

Mais um episódio...

Mutante

Há momentos em que sou esfinge ao entardecer –
muda-me o semblante com os raios do sol poente,
oblíquos como as coisas em que pareço pensar.

Dá-me a vida nos olhos e cega-me, marca a retina,
mas o fulgor é breve e não demora a passar, como
as marcas que deixei no caminho que ajudei a traçar.

Há instantes em que sou deus e Homem, oscilante,
e me busco onde não devo nem estou, porque
entretanto já passei e nem demorei o olhar…


sexta-feira, fevereiro 06, 2004

Amanhecer

A esfinge chegou...

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